sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Bagagem

Cheguei do trabalho agora.
As olheiras ganham terreno a cada dia, mas são olheiras felizes.
As coisas mudaram por aqui, mas mudaram nos rumos certos.
Os pontos altos do final de semana não são mais a noite e suas inconsequências deliciosas. Se tem algo que me enche os olhos quando penso que a semana acabou é a possibilidade de dormir muitas horas e fingir que a vida é mesmo esse marasmo gostoso de domingo.
Apesar do caminhar tranquilo, alguma coisa me incomoda hoje.

O que explica passarmos anos da vida investindo tempo e afeto nos projetos e pessoas erradas?
Teria me lamentado, caso tivesse optado por não viver algumas experiências?
Não tenho essa vaidade de dizer: “não me arrependo de nada”. Tenho outras. Muitas outras. Essa não.

Parte do meu passado recente, quando olho pra ele, parece um “cortar e colar” mal feito. É como se certas histórias não me pertencessem; como se eu fosse incapaz de encaixar algumas pessoas no espaço que um dia foi inquestionavelmente delas.
É um estranhamento sobre quem pude ser e, principalmente, uma incredulidade pelos direcionamentos dos meus afetos.
O que eu pude ver no fulano, que é radicalmente diferente de mim e do que desejo?
O que me foi oferecido?
O que me sustentou?

É como olhar pra trás e não identificar parte da sua vida como sendo sua. Alguém aqui entende a sensação de não reconhecer um velho conhecido? De não saber quem é aquele com quem você dividiu quase tudo que viu e ouviu em determinada época?
Acho que é um Alzheimer da alma.

Porque.
Porquê.
Por que.
Por quê.
Perfeito seria se, assim como na gramática, os porquês da vida não passassem de quatro.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Sobre a paixão

Não falo, exclusivamente, da paixão que une homem e mulher.
Falo da paixão como um sentimento necessário ao engajamento e à graça da vida.
Paixão, um sentimento que mobiliza, dá sentido, mostra direções, condiciona escolhas.
Não consigo pensar em nada mais enfadonho que uma vida sem paixão.

Paixão por uma causa, pelos amigos, pela carreira que escolheu, pela vocação que acredita ter, por um ideal político, por um dogma (esse pode ser perigoso, mas não pode ser esquecido), por um desejo ainda não realizado, pelo sossego que conquistou (por que não?).
A paixão não precisa ser sempre arrebatadora e, bem aproveitada, pode indicar caminhos de plenitude que a razão pura jamais encontraria. Isso porque a razão leva em conta muitos fatores: o que os outros vão pensar? Que estabilidade esse trabalho vai me dar? Como posso namorar esse irresponsável? Para que perder tempo com política? Mas tem pouquíssima astúcia para lidar com aquilo que realmente desejamos, aquilo que, de fato, nos fará felizes. Não vou aqui advogar a favor da paixão em detrimento da razão. Ainda não encontrei a medida certa para essa mistura, mas já aprendi que uma segura a onda da outra nas horas de necessidade.
Partindo disso, chego a pensar que a origem dessa crônica pode não passar de uma ansiedade sem tamanho. Ansiedade para encontrar essa proporção mágica, que nos trará a sensatez oportuna e a emotividade exata para cada situação.
Quem conseguir, meu e-mail é: falmesanfono@gmail.com.

terça-feira, 23 de março de 2010

O tipo de pessoa que eu sou

Não sou nenhum exemplo de boa conduta. Acho mesmo que nunca quis ser. Confesso que nunca vi muito charme nas pessoas excessivamente coerentes.À parte disso, sou boa amiga, solidária e muito leal.

Sim, eu sou estranha. Ouvi samba de manhã, dancei sozinha, falei sozinha; coisas que sempre repito. Não faria nada disso na frente de alguém, mas, pra ficar ainda mais estranho, estou aqui contando.

Agora me peguei às voltas com essa pergunta estúpida na cabeça: que tipo de pessoa eu sou? Coloquei o Sinatra pra tocar e vim aqui resolver isso. Acho que é culpa da tarde que termina. Acho que, por mais brega que pareça, parte da minha luz vai embora quando o dia acaba. Gosto do dia.
Tá aí...sou o tipo de pessoa que gosta do dia, de samba e de Jazz. O que também não significa que eu não goste da noite...até gosto bastante. Ah, não preciso escolher, não é? É relevante dizer que eu costumo acordar de muito bom humor, a não ser que eu tenha sido acordada por algum barulho, subitamente, sem tempo para me despedir do sono.

Quando chego em casa, ligo a TV, o som, o computador e acendo todas as luzes. Tem dias que a música é de fossa mesmo, não vou fazer tipo. Tem dias que curtir a fossa é quase uma modalidade esportiva pra mim. Acho que sou tataraneta do Lupicínio Rodrigues.
Tem dias que eu já me olho por dentro e sei que música de fossa não é boa idéia. Parece paradoxal, mas não é. Acompanhem comigo. Só dá pra curtir fossa se você estiver com o espírito fortalecido e os ânimos serenados. Isso se você entende que estou falando de uma fossa voluntária, com algum prazer que só Freud explicaria. Ou seja, quem curte fossa como eu é, na verdade, um forte disfarçado de frágil.
Nos dias realmente tristes, eu que não sou louca e nem quero gastar mais com análise, sei que o melhor é acordar com música dançante, na tentativa de forjar pra si mesma uma euforia. Acredite, funciona! Você começa fingindo que está feliz, cantarola 3 ou 4 versos parecidos com “agora quem não quer você sou eu...” e em questão de uma hora você já está feliz. Quando atinjo esse ponto, aproveito e vou ver gente, andar na rua, ver a cidade em movimento. Pode ser também que eu escolha um filme, de última hora, e vá assistir.

Pois é, puxando desse parágrafo de cima, lembrei que sou do tipo que ri e canta alto; do tipo que faz análise e está sempre pensando em sair dela, mas não tem coragem. Também brigo com a terapeuta se acho que não mudei nada nesse tempo todo. “Eu vou parar com essa droga! Diz aí pra mim uma coisinha sobre a qual eu tenha melhorado?! Anda, diz!”.

Há meia hora eu estava escrevendo a minha bendita dissertação e comecei a ficar encasquetada com as coisas que aconteceram durante a semana. Logo abandonei o arquivo importante e parti para esse aqui, o arquivo...o arquivo....bem, não sei que definição dar.
Receio que, em algum tempo, eu tenha escrito cem crônicas e minha dissertação esteja uma porcaria. Como dizia uma amiga minha do passado: “quero ser cientista, mas tenho alma de romancista”. Aí complica o meio de campo.

Falando em romance e também em falta de coerência, acho que sou uma prática muito romântica ou uma romântica muito prática. Não consegui ainda me enquadrar em um dos dois e nem decidir qual deles manda mais em mim. Também estou com preguiça de detalhar esse raciocínio, então vou partir pra outro.

Pensando bem...partir pra outro?
Também sou do tipo que encerra as coisas sem explicação, só porque deu vontade.

quinta-feira, 18 de março de 2010

A cor do dia

Hoje é daqueles dias tão cinzas que nem vontade de escrever eu tenho. Isso é grave. Breve, eu? O dia só pode mesmo estar muito cinza.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Lição II - Tudo na vida exige preparo

Pois é, eu fui a uma rave.
Primeira vez? Não, mas essa foi diferente.
Por culpa do sono incontrolável, justificado pelas 48 horas anteriores sem dormir, já cheguei ao evento sem forças para chacoalhar o meu corpinho. Sendo assim, passei de participante da festa à observadora de tudo e todos. “Coisa mais chata!”, podem pensar. Mas afirmo que foi uma experiência nova e interessante. Além do mais, foi a única alternativa de diversão que me sobrou, dado que eu mal conseguia manter meus olhos abertos. Eu poderia passar horas descrevendo as cenas e personagens que vi, mas como sou discreta (sim, às vezes sou) vou tentar falar mais a meu respeito.
Eu, ainda sob efeito do cansaço das noites de sexta e sábado, olhava todo aquele alvoroço e só pensava: “quanto tempo eu vou durar aqui?”. O fato é que me senti pairando sobre aquele lugar e não fazendo parte dele. Ao redor, garotinhas esquálidas aparentavam seus doze anos. Nas bochechas, uma quantidade tão expressiva de blush, que chuva nenhuma apagaria aquelas rodelas vermelhas. Eu me esforçava para manter o equilíbrio, mas os olhos fechavam e a mais sutil tentativa de movimento me fazia pender para frente. Olhando as fotos, podem pensar que eu estava viva, mas eu garanto: não era eu, era um zumbi.
Cada esbarrão eufórico dos coleguinhas de rave me transportava para outra dimensão. Via minhas amigas se contorcendo naquela dança engraçada e, mentalmente, eu também dançava horrores. Elas não podiam ver, mas eu dançava muito.
Já comentei sobre a lama? Cada pulinho do vizinho fazia respingar em mim alguns litros do mais geladinho e cremoso barro. Quando o sol nasceu, senti que meus amiguinhos não se lembraram de passar desodorante e foi nessa hora que todo o meu espírito de alegria coletiva começou a se esvair.
Comecei a tremer dos pés à cabeça e concluí que minha festa duraria menos tempo que a dos outros. Talvez comer alguma coisa pudesse ajudar. Eu era a carona da vez e não queria deixar ninguém na mão. Xandoca, amiga guerreira e leal, foi enfrentar fila por mim que, quase um poste, fiquei encostada no balcão socializando com o vendedor. Como não poderia deixar de ser, não havia nada naquele lugar que uma vegetariana comeria. Especialista que sou em furadas gastronômicas, escolhi o salgadinho de queijo e presunto, único que poderia passar pelo meu procedimento padrão de retirada da carne. Para vocês que nunca foram a uma festinha infantil comigo, segue a receita:
1 - desmantele o salgado em duas partes iguais;
2 – vá comendo a massa, separadamente, e reserve o recheio;
3 – terminada a massa, você ficará com o presunto e o queijo, enrolados, nas mãos;
4 – convide sua amiga solidária e esfomeada para se aproximar, pois ela será útil na próxima etapa;
5 – ofereça à amiga o presunto que restou. Não há dúvidas, ela vai aceitar.
6 – Simultaneamente, vá retirando a quantidade possível de queijo que estará fortemente grudado ao cadáver. Não desista, pois você precisa de proteína.
7 – Pronto! Você está alimentada!

Depois de todo esse trabalho, é claro, minha hora de ir para a caminha não tardou.
Qual é a lição, afinal de contas? Precisará ficar acordada durante horas seguidas em determinado dia? Poupe-se nos dois dias anteriores. Ou, em resumo: não sabe brincar, não desça para o play.

sábado, 6 de março de 2010

Mais do mesmo.

Dizem que as terapias só funcionam quando temos insights. Faço terapia há uns 2 anos e acredito que minha produção de insights esteja meio fraca. Pode ser também que essa história de pagar para que alguém te analise e ainda por cima analisar a si mesma o tempo todo não surta grandes efeitos, ou eu já seria, a essa altura do campeonato, a mais bem resolvida das mulheres sobre a Terra.
O fato é que hoje um desses estalos me ocorreu. Vai parecer óbvio para você que me lê. E é mesmo óbvio. Mas aprendi (em alguma aula de filosofia ou alguma conversa de bar) que as coisas óbvias não dispensam reflexão e podem trazer grandes respostas ou boas perguntas.
Conversava com um amigo hoje e falávamos sobre relacionamentos e o que esperávamos deles. Foi então que, conduzida pelo papo que se desenrolava, me veio uma pergunta essencial, que talvez eu nunca tenha me feito ou, pior, tenha me feito sem dar a devida atenção.
Que tipo de companheiro eu desejo ao meu lado?
Vivo, como muitos, numa sucessão de apaixonamentos mal resolvidos, intensos, complicados por cobranças de ambos os lados ou expectativas não supridas. Em suma, um prato cheio para uma lista de frustrações afetivas. É claro que no meio desta confusão muitas boas histórias aconteceram e muito amor rolou embaixo da ponte, portanto….não se compadeçam!
Bem, vamos deixar de lado a minha necessidade de fornecer justificativas idiotas e voltar ao assunto.
Movida pela emotividade da qual sou feita, não me lembro nunca de ter racionalizado as minhas escolhas. Acabei delegando todas ao “acaso” ou aos meus sentimentos supostamente autônomos. Porém, como gato escaldado tem medo de água fria, me vi obrigada a pensar a respeito e não simplesmente continuar seguindo o fluxo da maré e dos acontecimentos, o que me fez perceber que existe alguém no comando desse carro desgovernado.
O medo é saber que a comandante sou eu. Logo eu que mal conduzo um veículo de verdade, que só exige gestos mecânicos e frequentemente repetidos.
A pergunta martelou, martelou….
Será que eu sei que tipo de pessoa eu desejo?
E o tipo de pessoa que eu digo que desejo é o tipo de pessoa que costumo escolher?
Hum..hum…
Foi quando respondi ao meu amigo:
“Ah, eu só quero um homem inteligente, mas bem inteligente mesmo, até meio nerd; que adore os livros tanto quanto eu;que goste de cachorros; que seja apaixonado por música; que tenha um senso de humor apurado; que me faça rir, sem ser bobo; que tenha calma com minhas intempéries, sem, no entanto, parecer inerte; que queira viajar o mundo comigo; que tenha pela família o mesmo apego que eu; que me ajude a ser alguém melhor; de quem eu possa cuidar, mas que também perceba que preciso de cuidados; que seja presente, mas não sufocante; que não viva sem alguma poesia; que seja apaixonado pelo que faz, para que eu o admire. E, acima de tudo, que goste de mim como eu sou. Será que é pedir muito?”
Evidente que minha lista de exigências foi respondida com uma bela gargalhada.
Será que preciso encontrar alguém que se aproxime de tudo isso ou encontrar alguém que eu aceite como é, mesmo que ele queira me levar para comer churrasquinho em frente ao baile funk?
Comecei o texto achando que eu tinha encontrado grandes respostas. Ao final, talvez pelo barulho da TV, talvez pela janela piscante do MSN, posso garantir que, além de não saber responder nada, ainda fiquei com mais dúvidas.
Como eu disse em algum momento, pensar em coisas óbvias pode trazer grandes respostas, mas também acrescentar mais questões.
Droga, me enrolei toda. Vou tomar um chopp.

terça-feira, 2 de março de 2010

Quando um não quer, todos brigam

Não sou muito de usar frases feitas como provérbios, ditados populares e coisas do gênero. Prefiro montar meu próprio quebra-cabeça embasado nas minhas convicções e na minha (pouca) vivência. Porém admito que às vezes tais frases são necessárias para uma compreensão fácil e rápida de algumas situações.

“Quem tudo quer, tudo perde”, põe um freio em nossas ambições. Aquela da água mole em pedra dura já nos incentiva à persistência de algo. Ainda há aqueles em que “a sua inveja faz a minha fama”, puramente narcísicos. Já a andorinha que sozinha não faz verão nos conscientiza que “homem nenhum é uma ilha”. A casa de ferreiro e o espeto de pau estão em todos os lares. Mas o que dizer do “quando um não quer, dois não brigam”? O conselho é bom! Se o seguíssemos, seria muito mais fácil. Não quero, não quero e pronto. O respeito pela decisão de outrem imperaria e cada um seguiria seu rumo sem pestanejar. A nossa mente, neste instante, deveria processar a informação e executá-la mecanicamente. Entretanto, na prática, não é o que acontece. Principalmente no que tange ao término de relacionamentos afetivos.

Silêncio? O que se segue é uma série de indagações e de insistências, de dúvidas e incertezas... Mas não é nada fácil para ambos os lados. Não é fácil dizer não; muito menos ouvi-lo. Quem já bateu o pé no “não quero discutir” e conseguiu sair desta sem uma farpa sequer, que jogue a primeira pedra. Jogue outra, aquele que nunca questionou o não alheio; mesmo que tenha sido consigo próprio - “por que não eu?”. “Fala alguma coisa, vamos!” A gente nunca tem uma afonia nestes momentos. “Você é legal, mas...”. Que chato ser legal numa hora dessas! E a discussão – com o outro lado da moeda e com você mesmo – segue caminho.

O que se teme, posteriormente, são as conseqüências de quando um não quer: cada um age à sua maneira. Tem uns que desdenham com o “nem gostava tanto mesmo...” e aí eu me lembro da raposa e das uvas. Outros dizem que são assim mesmo, que não vão mudar nunca e quem quiser vai ter que gostar do jeito que são. Entretanto, eu prefiro acreditar no “seja você mesmo, mas não seja sempre o mesmo”.

E quando a procura pelos próprios defeitos se torna a mais nova missão de vida? Muitas vezes, identificamos-lhes e damos-lhes uma proporção aquém do que deveriam. “A culpa é do nariz! Eu sou horrível, eu não presto pra nada mesmo!” E nesta falta de compasso forçamo-nos a sermos alguém que não somos com o intuito de (re)conquistar o interesse do outro e de recuperar a auto-estima. Tanto esforço em vão...

Decerto que uma auto-reflexão nestas horas é algo a ser encarado com bons olhos: mudar o que pode ser mudado, melhorar o que pode ser melhorado e manter o que deve ser mantido. E como a esperança é a última que morre, de grão em grão encheremos nossas discussões de bom senso. Falar o necessário, ouvir o necessário, já que quem fala o que quer, ouve o que não quer. Quem sabe assim, mais amadurecidos, cheguemos no dia em que a compreensão seja o ponto forte para que dois não briguem quando um não quer. Devagar se vai ao longe e, um dia, chegaremos lá...